segunda-feira, 25 de maio de 2009

O EVANGELHO SEGUNDO MARIA MADALENA


O Evangelho Segundo Maria Madalena é um dos inúmeros livros que integram a literatura judaico-cristã não reconhecida pelas Igrejas cristãs — Católica Romana [Ocidental], Cristã Ortodoxa [Oriental], Protestantes, Evangélicas. O conjunto dos livros que compõem esta literatura é geralmente conhecido como Evangelhos Apócrifos, embora inclua Epístolas dos Apóstolos, Apocalipses e textos que tratam de temas pré-cristãos, os Testamentos. Existem, por exemplo, Gênesis e Livro de Adão apócrifos.

Significado de Apócrifo: o termo apócrifo tem significado amplo embora, em princípio, sua origem seja o substantivo grego apókpryphon ou, segredo, secreto. Em seu artigo A Outra Bíblia, Frei Jacir de Freitas Faria, Mestre em exegese [interpretação do texto] bíblica, reúne as muitas definições agregadas ao termo ao longo da história:

- algo precioso e, por isso, mantido em segredo;
- texto não usado oficialmente na liturgia das primeiras comunidades cristãs;
- texto conservado escondido por ter conteúdo não aceito;
- texto de origem desconhecida;
- texto falso ou falsificado no conteúdo ou título.
- livros de uso restrito por leitores de uma determinada corrente de pensamento;
- textos não inspirados e, por isso, não canônicos;
- livros parecidos com os considerados canônicos, mas de estilos literários diversos;
- textos que complementam o conteúdo, o sentido dos escritos canônicos, isto é, os escritos considerados inspirados e que, por isso, fazem parte da Bíblia. Esses textos podem, até mesmo, oferecer dados esquecidos ou pontos de vistas diferenciados dos que permaneceram como oficiais.

A Igreja Católica simplifica a questão classificando todos os livros não incluídos na Bíblia canônica [aceita pelo Vaticano] como falsos ou, no mínimo, de conteúdo duvidoso. Sobre os Apócrifos, escre Freitas Faria, em outro artigo, Segredos de História e Fé:

Apócrifo deriva do grego apókpryphos. A definição mais conhecida para apócrifo é texto falso no conteúdo ou no título e que, por isso, não entrou na lista dos livros inspirados, na Bíblia. Os apócrifos seriam meras fantasias de piedosos cristãos. Na verdade, entre os primeiros cristãos circulavam muitos textos sobre a vida de Jesus e seus seguidores.

Fala-se em uma lista de 60 apócrifos do Novo Testamento (Segundo Testamento) e outros 52 do Antigo Testamento (Primeiro Testamento). Muitos deles foram parar na fogueira. O decreto Gelasiano (referente ao Papa Gelásio – falecido em 496) proibia a utilização desses livros pelos cristãos. ...

Não por menos, na coletânea dos livros apócrifos do Segundo Testamento encontramos, por exemplo: Evangelhos (de Maria Madalena, de Tomé, de Filipe, Árabe da Infância de Jesus, do Pseudo-Tomé, de Tiago, do Nascimento de Maria); Atos (de Pedro, de Tecla e Paulo, dos doze apóstolos, de Pilatos); Epístolas (de Pilatos a Herodes, de Pilatos a Tibério, dos apóstolos, de Pedro a Filipe, Paulo aos Laodicenses, Terceira epístola aos Coríntios); Apocalipses (de Tiago; de João, de Estevão, de Pedro); Outros (A filha de Pedro, Descida de Cristo aos Infernos, Declaração de José de Arimatéia). Os originais desses textos estão em grego, latim, siríaco, copto, etíope, etc. Muitos deles são apenas fragmentos. Os evangelhos de Maria Madalena e Tomé, em copto, foram descobertos no alto Egito, em Nag Hamadi, em 1945.

VEJA TAMBÉM: LISTA DE LIVROS APÓCRIFOS E BREVE HISTÓRICO


Histórico:
O Evangelho de Maria Madalena pertence, mais precisamente, ao Codex Akhmin, também chamado Papyrus Berolinensis 8502. Foi descoberto na cidade de Akhmin, Egito, em 1896, e adquirido, no Cairo, pelo pesquisador alemão Carl Reinhardt. Originalmente, ao que parece, tinha 19 páginas, em papiro, escrito em dialeto copta egípcio, datado, imprecisamente, entre os séculos III e V. O texto estava incompleto; faltam as páginas de 1 a 6 e de 11 a 14 [HOLLY BOOKS].

Foi publicado, pela primeira vez, em 1955. Mais tarde, entre 1897 e 1906, dois outros fragmentos deste evangelho foram encontrados, pelos ingleses: o egiptólogo Bernard Pyne Grenfell [1869-1926] e o papirólogo Arthur Surridge Hunt [1871-1934]. Escritos em grego, são denominados: o Papyrus Oxyhynchus L 3525 [fig. acima] e o Papyrus Rylands 463. A versão destes novos fragmentos, que complementam e confirmam o texto do Codex Akhmin, foi publicada em 1983.

As Três Marias do Evangelho

O texto que hoje é conhecido como Evangelho de Maria Madalena, tal como outros textos muito antigos, datados entre os séculos I a V da Era Cristã, foi escrito em papiro e muitas de suas partes se perderam; das 19 páginas, ao menos 8 se perderam. A autoria, de acordo com o que foi constatado nos originais, é atribuída, simplesmente, a Maria, sem uma identificação mais precisa da autora, o que suscita especulações: o Evangelho poderia ter sido escrito por Maria, mãe de Jesus ou, até mesmo por Maria de Betânia, irmã de Lázaro [aquele que ressuscitou e Marta.

Todavia, a exegese dos textos bíblicos leva a crer que Maria Madalena é a personagem que melhor se encaixa no perfil de uma mulher que, na época, poderia ter assumido um papel importante no processo de evangelização dos primeiros tempos do cristianismo, logo depois da morte de Jesus. Pequenos indícios em detalhes mínimos dos evangelhos sinóticos [da Bíblia] permitem supor que Maria Madalena, aquela de quem Jesus expulsou sete espíritos malignos, possuía uma situação privilegiada para as mulheres de seu tempo. Acredita-se que tinha posses, era independente e culta, ou seja, letrada além de ser bela e bem falante.

Maria Madalena

Na Introdução à Vida de Santa Maria Madalena, texto integrante da obra Vida de Santa Maria Madalena, de autor anônimo do Século XIV, produzido pelo Programa de Estudos Medievais da Universidade Federal do Rio de Janeiro, as autoras [tradutoras/comentadoras] assinalam as passagens bíblicas que revelam um pouco de quem foi Maria Madalena no contexto social da época de Cristo. Entretanto, a dimensão de Maria Madalena, sua importância, seu papel como discípula de Jesus, são melhor determinados nos outros evangelhos apócrifos, que foram acolhidos pelos Gnósticos:

Maria de Magdala, ou Maria Madalena, é a figura feminina mais citada no Novo Testamento - ainda mais que a Virgem. Além disso, é personagem importante na cena da ressurreição de Cristo.

No Evangelho segundo Mateus ela é mencionada diretamente duas vezes. Em Mt. 27,56, na cena da crucificação, é a primeira a ser nomeada entre as mulheres que acompanhavam Jesus desde a Galiléia, e em Mt. 28,1, no relato da ressurreição, ocasião em que Jesus aparece às mulheres e ordena que dêem a notícia aos apóstolos e que estes sigam até a Galiléia, é novamente lembrada em primeiro lugar: “Maria Madalena e a outra Maria foram ver o sepulcro”.

Marcos se refere a ela quatro vezes. Na cena da crucificação, em Mc. 15,40-41, ela é mais uma vez identificada como parte do grupo de mulheres que seguiam a Jesus desde a Galiléia e é citada, também, em primeiro lugar: “Estavam também ali algumas mulheres, observando de longe; entre elas Maria Madalena, Maria, mãe de Tiago, o menor, e de José, e Salomé”. Um pouco mais à frente, em Mc. 15,47, ela é apontada como testemunha do sepultamento:

“Ora, Maria Madalena, e Maria, mãe de José, observaram onde ele foi posto.” O relato da ressurreição segundo o Evangelho de Marcos é o que dá mais importância a Madalena. Ela é destacada duas vezes: em Mc. 16,1, ela aparece indo comprar aromas com outras mulheres para embalsamar Jesus; e em Mc. 16,9 afirma-se: “Havendo ele ressuscitado de manhã cedo no primeiro dia da semana, apareceu primeiro a Maria Madalena, da qual expelira sete demônios.”

O Evangelho segundo Lucas faz alusões diretas e indiretas a Maria Madalena. Em Lc. 8,2-3 ela é mencionada como uma das mulheres que seguiam a Jesus; dela “saíram sete demônios”; e, junto a outras mulheres, prestava assistência a Cristo com os seus bens. Em Lc. 23, nos relatos da morte e sepultamento de Jesus, ela figura como uma das discípulas que o acompanhavam desde a Galiléia, primeiro assistindo a crucificação e, depois, preparando aromas e bálsamos para ungir o corpo do mestre.

A partir desses dados bíblicos, podemos construir alguns aspectos de sua biografia: Maria Madalena era uma mulher de posses que vivia na cidade de Magdala; após uma experiência religiosa, tornou-se discípula de Jesus, acompanhando- o em suas viagens, junto a outros discípulos, homens e mulheres, e inclusive financiando-o.

Pela forma como é nomeada, é possível inferir que possuía uma situação familiar incomum em seu tempo. Diferentemente de outras mulheres das Escrituras, ela é identificada por seu lugar de origem ao invés da referência a um homem, forma de designação mais usada para as mulheres neste momento. Sendo Maria relacionada somente à sua cidade, Magdala, aliás, de onde deriva o nome Madalena, é provável que ela fosse uma mulher solteira e independente.

O gnosticismo foi uma doutrina que inspirou a formação de um conjunto de seitas cristãs - condenadas pela Igreja como heterodoxas - sobretudo nos três primeiros séculos de nossa era. ...

Os gnósticos fixaram suas tradições sobre Cristo e os apóstolos em vários evangelhos apócrifos redigidos, em sua maioria, entre os séculos II e IV. Madalena figura nesses textos com freqüência, pois era vista como a encarnação da sabedoria celeste e como companheira de Jesus. Em todos estes escritos, ela é tida como o modelo de gnóstico perfeito, na medida em que se eleva ao ápice da visão e do amor espiritual.

IN Pem - Programa de Estudos Medievais | Universidade Federal do Rio de Janeiro — Instituto de Filosofia e Ciências Sociais
Vida de Santa Maria Madalena - Texto Anônimo do Século XIV. [Intodução, trad. e notas: LOPES FRAZÃO DA SILVA, Andréia Cristina, FORTES, Carolina Coelho et. al.]
— Rio de janeiro: Ed. Márcia Cristina Martins | Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2002.

No Evangelho de Felipe, Madalena é apresentada como companheira de Cristo; no Evangelho de Tomé, é a consorte do Senhor e sua interlocutora mais importante e na Pistis Sophia, tratado gnóstico do século III, a maior parte das perguntas é feita por Maria Madalena.

O texto do Evangelho de Maria Madalena, apesar de extremamente fragmentado, guarda semelhança com outros apócrifos no sentido de abordar temas complexos da espiritualidade que são evitados nos quatro evangelhos canônicos. O capítulo VIII fala, ainda que de forma alegórica, da essência da alma, que ali é chamada devoradora de homens, conquistadora do espaço.

LINKS:
Versão em Inglês, em capítulos do Evangelho Segundo Maria Madalena
Pistis Sophia Revelada por Samael aun Weor

O EVANGELHO SEGUNDO MARIA MADALENA trechos

Capítulo IV O Salvador disse: "Todas as espécies, todas as formações, todas as criaturas estão unidas, elas dependem umas das outras, e se separarão novamente em sua própria origem. Pois a essência da matéria somente se separará de novo em sua própria essência. Quem tem ouvidos para ouvir que ouça".

Pedro lhe disse: "Já que nos explicaste tudo, dize-nos isso também: o que é o pecado do mundo?" Jesus disse: "Não há pecado; sois vós que os criais, quando fazeis coisas da mesma espécie que o adultério, que é chamado 'pecado'. Por isso Deus Pai veio para o meio de vós, para a essência de cada espécie, para conduzi-la a sua origem."

Em seguida disse: "Por isso adoeceis e morreis [...]. Aquele que compreende minhas palavras, que as coloque-as em prática. A matéria produziu uma paixão sem igual, que se originou de algo contrário à Natureza Divina. A partir daí, todo o corpo se desequilibra. Essa é a razão por que vos digo: tende coragem, e se estiverdes desanimados, procurais força das diferentes manifestações da natureza. Quem tem ouvidos para ouvir que ouça."

Quando o Filho de Deus assim falou, saudou a todos dizendo: "A Paz esteja convosco. Recebei minha paz. Tomai cuidado para ninguém vos afaste do caminho, dizendo: 'Por aqui' ou 'Por lá', Pois o Filho do Homem está dentro de vós. Segui-o. Quem o procurar, o encontrará. Prossegui agora, então, pregai o Evangelho do Reino. Não estabeleçais outras regras, além das que vos mostrei, e não instituais como legislador, senão sereis cerceados por elas". Após dizer tudo isto partiu.

Capítulo V Mas eles estavam profundamente tristes. E falavam: "Como vamos pregar aos gentios o Evangelho ao Reino do Filho do Homem? Se eles não o procuraram, vão poupar a nós?" Maria Madalena se levantou, cumprimentou a todos e disse a seus irmãos: "Não vos lamentais nem sofrais, nem hesiteis, pois sua graça estará inteiramente convosco e vos protegerá. Antes, louvemos sua grandeza, pois Ele nos preparou e nos fez homens".

Após Maria ter dito isso, eles entregaram seus corações a Deus e começaram a conversar sobre as palavras do Salvador. Pedro disse a Maria: "Irmã, sabemos que o Salvador te amava mais do que qualquer outra mulher. Conta-nos as palavras do Salvador, as de que te lembras, aquelas que só tu sabes e nós nem ouvimos."

Maria Madalena respondeu dizendo: "Esclarecerei a vós o que está oculto". E ela começou a falar essas palavras: "Eu", disse ela, "eu tive uma visão do Senhor e contei a Ele: 'Mestre, apareceste-me hoje numa visão'. Ele respondeu e me disse: 'Bem aventurada sejas, por não teres fraquejado ao me ver. Pois, onde está a mente há um tesouro'. Eu lhe disse: 'Mestre, aquele que tem uma visão vê com a alma ou como espírito?' Jesus respondeu e disse: "Não vê nem com a alma nem com o espírito, mas com a consciência, que está entre ambos - assim é que tem a visão [...]".



Capítulo VIII E o desejo disse à alma: 'Não te vi descer, mas agora te vejo subir. Por que falas mentira, já que pertences a mim?' A alma respondeu e disse:'Eu te vi. Não me viste, nem me reconheceste. Usaste-me como acessório e não me reconheceste.' Depois de dizer isso, a alma foi embora, exultante de alegria. "De novo alcançou a terceira potência, chamada ignorância. A potência, inquiriu a alma dizendo: 'Onde vais? Estás aprisionada à maldade. Estás aprisionada, não julgues!'

E a alma disse: 'Por que me julgaste apesar de eu não haver julgado? Eu estava aprisionada; no entanto, não aprisionei. Não fui reconhecida que o Todo se está desfazendo, tanto as coisas terrenas quanto as celestiais.' "Quando a alma venceu a terceira potência, subiu e viu a quarta potência, que assumiu sete formas. A primeira forma, trevas; a segunda, desejo; a terceira, ignorância; a quarta, é a comoção da morte; a quinta, é o reino da carne; a sexta, é a vã sabedoria da carne; a sétima, a sabedoria irada. Essas são as sete potências da ira.

Elas perguntaram à alma: 'De onde vens, devoradora de homens, ou onde vais, conquistadora do espaço?' A alma respondeu dizendo: 'O que me subjugava foi eliminado e o que me fazia voltar foi derrotado... e meu desejo foi consumido e a ignorância morreu. Num mundo fui libertada de outro mundo; num tipo fui libertada de um tipo celestial e também dos grilhões do esquecimento, que são transitórios. Daqui em diante, alcançarei em silêncio o final do tempo propício, do reino eterno'."


Capítulo IX Depois de ter dito isso, Maria Madalena se calou, pois até aqui o Salvador lhe tinha falado. Mas André respondeu e disse aos irmãos:"Dizei o que tendes para dizer sobre o que ela falou. Eu, de minha parte, não acredito que o Salvador tenha dito isso. Pois esses ensinamentos carregam idéias estranhas". Pedro respondeu e falou sobre as mesmas coisas.

Ele os inquiriu sobre o Salvador:"Será que ele realmente conversou em particular com uma mulher e não abertamente conosco? Devemos mudar de opinião e ouvirmos ela? Ele a preferiu a nós?" Então Maria Madalena se lamentou e disse a Pedro: "Pedro, meu irmão, o que estás pensando? Achas que inventei tudo isso no mau coração ou que estou mentindo sobre o Salvador?"

Levi respondeu a Pedro: "Pedro, sempre fostes exaltado. Agora te vejo competindo com uma mulher como adversário. Mas, se o Salvador a fez merecedora, quem és tu para rejeitá-la? Certamente o Salvador a conhece bem. Daí a ter amado mais do que a nós. É antes, o caso de nos envergonharmos e assumirmos o homem perfeito e nos separaremos, como Ele nos mandou, e pregarmos o Evangelho, não criando nenhuma regra ou lei, além das que o Salvador nos legou." Depois que Levi disse essas palavras, eles começaram a sair para anunciar e pregar.

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